Um azul não se canta impunemente…
Promete a folha em branco, sem o traço
que a véspera gravou a lápis de aço
à hora de se andar por entre a gente.
De manhã a frescura lava as nódoas,
a luz declina um nome: recomeço,
e a vida esquece já o seu avesso
quando o olhar nas alturas perde o norte.
Basta a aragem, um gorjeio, odor a pão
e o corpo desdobrando-se na lenta
alegria da humana condição.
Mas a vida não cede, já se sente
pela tarde o ameaço de trovão…
Não se canta um azul impunemente.
A Doença das Cores seguido de Ilhas de Deus
Braga: Poética, 2016